Depois de uma rápida viagem de
ônibus, chegamos em Careaçu MG, as 2 horas da madrugada. Aproveitamos o restinho da
noite para dormir na simpática pousada Castelo.
O dia primeiro de Maio amanheceu esplendoroso, com aquele friozinho de
outono, céu azul e o cheiro de aventura pela frente. Os bikers do grupo acordaram
animados logo cedo para cumprir o horário planejado, mas uma coisa aqui, outra ali e
acabamos saindo com 45 minutos depois do horário planejado que era as oito da manhã,
entretanto neste primeiro e no segundo dia nós não tínhamos nenhum compromisso com
horários, então prá que estressar.
Saímos de Careaçu sentido Silvianópolis por uma estrada que corta
fazendas de pecuária e café, foram
aproximadamente vinte
quilômetros curtindo o início da aventura, passamos por Silvianópolis, onde fizemos uma
breve parada para um refrigerante e o Ronei aproveitou para ajustar o selim da bike, mal
sabia ele, e quase todos os outros, que o selim da bike ia se tornar o grande obstáculo
nos dias finais do Crazy Trip.
O trecho seguinte: Silvianópolis Espirito Santo do Dourado,
tinha uma topografia bem diferente do primeiro trecho, com uma serra forte e longa para
transpormos. Em meio a serra uma bifurcação traiçoeira
e o ímpeto de seguir a
principal sem esperar pelo guia, eu, fez alguns ganharem um bônus, felizmente foram
apenas algumas centenas de metros morro acima e os meus assobios os trouxeram de volta.
Começamos a subir por uma estrada meio abandonada, a Lucy com suas pernas
"biônicas" ia na frente abrindo as porteiras para os outros.

Este trecho de serra fora o único que eu não tinha feito de jeep
durante o reconhecimento, pois já o tinha feito em dezembro de 2002 e o trajeto já
estava gravado no GPS. Vencida a parte da subida, começamos a descer em direção à
Passa Quatro, um bairro ao pé da serra,
mas faltando uns dois
quilômetros para chegar lá chegamos em uma bifurcação, consultei o GPS, que indicava
seguir a direita, mas vi no painel do aparelho que o caminho após o bairro voltava num
ângulo de 120 graus, o que sugeria um possível corte de caminho se seguíssemos a
esquerda, expus o fato ao grupo e recebi um olhar generalizado de "roubada a
vista". Tomei a decisão pelo possível atalho e lá fomos nós morro abaixo, com
aquele friozinho na barriga, pensando numa possível volta morro acima, felizmente tudo
deu certo e chegamos na estrada para Espirito Santo do Dourado. Pedalando por uma estrada
de asfalto precário, víamos a nossa direita a próxima serra, a qual seria bem mais
longa que a primeira, entretanto com inclinação não tão acentuada.
A segunda parada oficial do dia em Espirito Santo do Dourado, foi
sossegada, todos se preparando psicologicamente para a serra que nos observava
silenciosamente, lá em cima encontraríamos a primeira confluência do Crazy Trip, serão
duas, mas somente esta primeira é possível alcançar de bike, pois a
segunda
fica em meio as águas da represa de furnas.
Quilômetros e mais quilômetros morro acima, por uma estrada larga que
nos levou a um planalto com altitude entre 1.300 e 1.400 metros acima do nível do mar,
entretanto chegar lá em cima não resultou no fim das subidas, pequenos morros e vales
constituíam um sobe e desce constante, por fim chegamos na confluência da coordenada
S22º 00 00 com a coordenada W46º 00 00,
tiramos umas fotos e prosseguimos pelo planalto
subindo e descendo os pequenos vales, encontramos no topo de uma das subidas uma
bifurcação e ao lado uma fazenda onde os moradores muito hospitaleiros nos
ofereceram água, enquanto
saciávamos nossa sede e nos refrescávamos numa deliciosa mangueira, foi nos oferecido,
pinhão, queijo e café, fruto da hospitalidade do povo mineiro.
Saciados e com as energias renovadas partimos para o
restante do planalto, aguardando ansiosos pela Pedra do Navio, local próximo a borda do
mesmo, pois mais adiante teríamos a longa e sinuosa descida para São João da Mata.
Chegando lá fizemos uma parada tranqüila junto a Pedra do Navio
com direito a poses para fotos e um lanche de barrinha de cereais. A noite estava se
aproximando, tudo indicava que iríamos ter um trecho noturno, partimos para o tão
esperado downhill e nos deleitamos com cinco quilômetros de descida com um desnível de
500 metros, chegando em São João da Mata fomos à procura do nosso ônibus, que deveria
estar por ali a nossa espera, atravessamos a cidade e o encontramos junto a um posto de
gasolina, fizemos uma parada preparatória para o próximo trecho com destino à Poço
Fundo, distante a 18
quilômetros por asfalto, que com
certeza terminaria a noite.
A intenção era seguirmos todos juntos, aproveitando o
vácuo um do outro e formarmos um pelotão que nos
traria mais segurança naquele trecho, mas a diferença de preparo físico dos integrantes
do grupo e a falta de consciência coletiva tornou esta tarefa impossível de ser
cumprida, fora isto, foi um trecho bastante divertido, resultando na incrível média
horária acima de 26 km/h com mais de 70 quilômetros já percorridos.
Terminamos o dia as 18:20 em Poço Fundo com 90 quilômetros
percorridos, agora era esperar pelo jantar e o descanso para o dia seguinte.
A grande questão que rondava a mente de todos era: será que vamos
pegar chuva? As previsões do tempo indicava a chegada de uma frente fria para
sexta-feira, dia 2 de maio. A primeira coisa que fiz ao levantar no dia seguinte foi ir
ver o céu, ainda estava azul, mas já se via várias nuvens cirus, que indicavam a
chegada da frente fria, o que teríamos até o final do dia? Pensei.
Partimos de Poço Fundo as 8:20, o primeiro trecho até a
cidade de Machado constituía-se de poucas subidas, sendo apenas uma longa, mas já no
final do trecho. Chegando em Machado não encontramos o nosso ônibus no local combinado,
mas em todo caso não estávamos necessitando dele, fizemos nossa parada para
alimentação e descanso para então prosseguir rumo a Alfenas. Atravessando a cidade de
Machado, encontramos o nosso ônibus parado em outro local, passado as instruções para o
próximo encontro, seguimos em frente.
Saímos de Machado atravessando um pequena serra e chegamos no Bairro
de Caiana, onde fizemos uma parada num barzinho. As nuvens estavam aumentando e a
probabilidade de chuvas também, já começávamos a nos preparar psicologicamente para
enfrentar a chuva no fim do dia. Outro grande obstáculo que começa a incomodar a vários
do grupo era a dor na bunda, o Ronei era até o momento o que mais sofria devido ao selim
da sua bike nova, mas em geral o que se via era posições alternativas sobre a bike na
tentativa de aliviar as dores.
Pastagens, plantações, gado, subidas, descidas e
finalmente avistamos a cidade de Alfenas, após um pequeno trecho de asfalto chegamos no
trevo da cidade, onde o nosso ônibus deveria estar nos esperando, mas não estava,
como não tínhamos tempo sobrando e o prenúncio de chuva estava aumentando, resolvemos
prosseguir. Alguns quarteirões adiante o nosso ônibus nos alcança e muito a contra
gosto o Ronei decide prosseguir nele, além de procurar por uma bicicletaria para comprar
um banco mais macio com a esperança de amenizar as dores seu objetivo era se preservar
para o restante da viagem.
Atravessamos a cidade de Alfenas, fazendo uma parada estratégica numa
padaria e seguimos em direção a Represa de Furnas, lá teríamos que atravessar a balsa.
Entravamos agora numa região de topografia diferente das
anteriores e das que normalmente estamos acostumado a ver, são extensas planícies por
onde seguíamos em intermináveis retas.
Chegamos no porto da balsa instantes depois dela ter partido,
teríamos que esperar pela próxima viagem. As águas da represa estavam encrespada pelo
vento e a chuva ameaçava a cair, nos abrigamos num barzinho junto ao porto. Depois de 45
minutos finalmente embarcamos e para o nosso espanto a balsa partiu sem levar os carros,
então ficamos sabendo que ela ia fazer antes uma viagem para o porto de Areado,
retornaria para o porto de Alfenas, de onde partimos e só então iria para o porto de
Alterosa, onde desembarcaríamos; de certa forma foi interessante, pois aproveitamos a
balsa vazia para nos divertirmos tirando todo tipo de fotos. Finalmente uma hora e meia
depois desembarcamos de uma balsa lotada, com um ônibus e vários carro para enfrentar
logo de cara uma subida.
Naquele instante começava uma cena tremendamente surrealista, o céu
carregado de nuvens negras e ameaçadoras, os veículos e passageiros do ônibus saindo
apressados da balsa, impingiam um clima de uma iminente catástrofe, para complementar a
cena o vento forte levantava a poeira da estrada, que por sorte estava a favor e nos
ajudava a subir, os carros e o ônibus passando por nós só fazia aumentar aquela nuvem
de poeira, por fim quando pensávamos estar livre dos veículos, eis que surge em sentido
contrário, um caminhão em alta velocidade, tentando chegar a tempo para pegar a balsa e
levantando uma imensa nuvem de poeira, ali estava formado um palco de sensações que nos
acompanharia pelo resto do dia e noite adentro.
Seguíamos num ritmo forte, tentando aproveitar ao máximo, enquanto a
chuva não chegava, ela estava a nossa volta e para piorar começamos a encontrar os
mata-burros longitudinais com vão central, era muito arriscado tentar atravessar sem
descer da bike, cair entre as barras de ferro seria na certa perder uma roda da bike, mas
não foi um mata-burro e sim um enorme prego que encontrou o pneu da bike da Lucy, mas um
pit-stop rápido nos deixou apto a prosseguir instantes depois.
A noite nos pegou, mas a chuva parecia estar sendo generosa e não caia
sobre nós; passamos a encontrar trechos por onde ela tinha passado e sendo o suficiente
apenas para apagar a poeira, sem formar lama. Novamente o grupo começou a se dispersar,
não havendo bifurcações que gerassem duvidas, os mais rápidos seguiram adiante sem se
questionar sobre as condições dos demais. Encontrei o Jorge andando as escura, ele tinha
esquecido o farol e passou a seguir junto comigo, mas o meu farol, um Cateye modelo EL
100, pouco ajudava acima dos 15 km/h, a única vantagem deste modelo é sua longa
autonomia, é um farol para emergências.
Finalmente avistamos as luzes de Alterosa, ao chegar no trevo
encontrei os que estava adiante esperando, restavam para trás o Robie e o Cláudio, que
reclamou com toda a razão da desunião do grupo. Entramos na cidade e fomos para o hotel,
mal entramos e a chuva despencou. Terminamos o dia as 18:44, completando mais uma etapa de
90 quilômetros.
O restaurante agendado para o jantar ficava longe do hotel,
obrigando-nos a ir com o nosso ônibus, mas na volta vários de nós resolvemos voltar
caminhando, houve momentos durante a caminhada em que a chuva recomeçou, nos deixando
meio apreensivos, mas ela era fraca. No caminho paramos num quiosque para um sorvete de
sobremesa e conjeturamos sobre o dia seguinte, seria a etapa mais longa e para complicar
teríamos que atravessar duas balsa, mas diferentemente daquela pela qual tínhamos
passado hoje, estas tinham horários fixos e programados.
Já no hotel, comecei a analisar o contexto do dia seguinte, o plano
inicial seria sairmos a sete horas, assim teríamos tempo de sobra para pegar a balsa das
13 horas, mas com o cansaço acumulado acabei transferindo o horário de saída para as
oito, isto nos deixaria com um tempo justo para a esta primeira balsa, outro fator
complicador era a chuva, caso o dia seguinte amanhecesse chovendo, eu descartaria o trecho
de terra até Conceição da Aparecida e seguiríamos direto por asfalto para Carmo do Rio
Claro, em todo caso se perdêssemos a balsa das 13 horas pegaríamos a das 15 horas,
acarretando um atraso de duas horas, definido as opções fui deitar, instantes depois
ouço uma moto passar tocando uma buzina esquisita pela rua ao lado do hotel e pensei:
não escapamos dos desordeiros nem nas cidades pacatas do interior e adormeci. Lá pelas
três da madrugada, com boa parte do sono já recuperado, acordo com o som da mesma buzina
esquisita, achei estranho aquilo, então me lembrei que em várias cidades de minas ainda
se encontram os vigilantes noturnos que caminham pelas ruas da cidade apitando
incessantemente para espantar apenas os fantasmas, visto que para segurança este
"des" serviço é inútil, o que pode ser comprovado por qualquer pessoa de bom
senso, com esta dúvida na cabeça não consegui dormir e minutos depois eis que ouço lá
ao longe, aquela maldita buzina vindo cada vez mais perto e passa ao lado da janela do
quarto em que eu estava, daquele instante em diante não consegui mais dormir direito,
pois sabia que logo seria acordado pelos F.D.P que se denominam Anjos da Noite na cidade
de Alterosa MG, eles são na verdade os demônios da noite e espero que eles e todos
aqueles que fazem a mesma função nesta e em qualquer outra cidade vão se danar, que
caiam de suas motos e MORAM. Ufa! Desabafei minha raiva por uma noite mal dormida e espero
nunca mais ter que voltar nesta maldita cidade.
O sábado amanheceu com um céu azul de brigadeiro, uma brisa fria
típica de outono e um chão molhado pelas chuvas da noite, aquele cenário amenizou a
minha raiva pela noite mal dormida e a decepção pelo café "reforçado"
prometido pela dona do hotel, apenas café com leite ou nescau, um pão, isso mesmo,
apenas um pão por pessoa e ainda daqueles bromatado, manteiga e o "reforço":
um potinho de iogurte.
O trecho até Conceição da Aparecida é predominantemente de subidas,
visto que esta cidade se localiza
em uma altitude superior a
Alterosa, quando iniciamos a maior delas, ainda na primeira metade deste trecho, temos um
pneu furado, justo hoje que temos um horário apertado e já saímos com dez minutos
atrasados. Para cumprirmos o planejado tínhamos que manter uma média horária de 12
km/h, incluindo as paradas, com o atraso inicial, esta média tinha que ser agora de 12,3
km/h. eu já esperava não conseguir manter esta média horária neste trecho inicial até
Conceição da Aparecida, devido as subidas, contava sim, com o trecho seguinte com um bom
trecho de descida e em asfalto para recuperar e até aumentar a média. Mas a lei de
Murphi se fez presente e no fim de uma descida mais um pneu furado, com isto nossa média
despencou para menos de 9 km/h, sem saber o quanto conseguiríamos recuperar no próximo
trecho, já estava considerando pegar a balsa das 15 horas. Chegamos em Conceição da
Aparecida ainda com uma boa recuperação, atingindo os 10,8 km/h, uma parada rápida num
barzinho e partimos em direção a Carmo do Rio Claro.
Foi com alivio que vi o ciclocomputador indicar um aumento
significativo da média horária e quando nos encontramos com o nosso ônibus, no ponto de
parada programado, nossa média horária tinha chegado a 13, 5 km/h, podiamos nos dar ao
luxo de uma parada tranqüila e tudo indicava que seria facil nossa
jornada rumo a balsa. Faltavam ainda uns 12 km
para Carmo do Rio Claro, com uma estrada de asfalto de pouco movimento e algumas subidas
leves. Entramos na cidade de Carmo do Rio Claro com 13,5 km/h de média horária, eu
estava até pensando em fazer uma rápida parada numa padaria qualquer, mas foi só pensar
nisto e eis que acontece o que não devia acontecer: uma corrente quebrada. O grupo parou
meio distante dos que ficaram auxiliando o conserto, uns quinze minutos depois, resolvi
ver o por que da demora e constatei que ao invés de arrumar a corrente eles tinham
piorado as coisas pelo uso de ferramenta inadequada, tira-se mais um elo da corrente
pronto, agora podemos ir. ao consultar o ciclo computador, constatei que aquela parada
forçada tinha feito nossa média horária despencar para um tenebroso 11,6 km/h, eram
11:58, faltava ainda 18,5 km até a balsa por um caminho não muito difícil, entretanto
estávamos com mais de 45 km naquele dia e 220 na viagem, no trecho de saída da cidade
fiz uns cálculo e achei que ainda era
possível alcançar a balsa das
13 horas, levando em consideração que eu era um dos mais fraco do grupo e conhecedor do
que caminho a frente, senti que seria capaz de chegar lá, pelo menos em cima da hora.
Coloquei a situação para o pessoal e começamos a imprimir um ritmo forte; do grupo eu
sabia que o Denilson, a Lucy , o Jorge e o Rogério tinham condições tranqüilas de
chegar na balsa com tempo de sobra, O Kleber e o Cláudio estariam logo atrás, restando
apenas eu, o Ronei e o Robie num patamar mais inferior. Seguindo atrás de todos vi que o
Robie insistia em ir num giro muito elevado, isto lhe tirava uns bons 5 km/h em relação
aos outros, recomendei que ele usasse marcha mais pesada mais ele relutava em atender o
meu pedido, então fiquei irado e passei por ele e pelo Ronei e disse a estes "Fala
para o seu irmão, que se ele não forçar, não vamos chegar a tempo" e fui em
frente num ritmo que eu sabia ser o suficiente e com o qual eu agüentaria chegar até a
balsa. Eis que instante depois o Robie passa por mim já num giro mais adequado e bastante
decidido a ir sempre a minha frente. Tentei por um momento acompanha-lo, mas ele estava
num ritmo mais forte que eu poderia agüentar, a partir daquele momento eu passei a ser o
lanterninha da turma, não por opção, mas por condição mesmo, seguia no limite
suportável das dores nas costas e ia refazendo os cálculos para ver se obteríamos
sucesso nesta louca corrida contra o tempo. O grupo parava para me esperar apenas nas
bifurcações, nas quais eu chegava não mais de dois minutos depois do primeiro, numa
destas bifurcações pedia ao Denilson que seguisse na frente, visto que não havia como
errar o caminho, e pedir para a balsa esperar alguns minutos, caso alguns de nós não
conseguíssemos chegara a tempo, com ele forma a Lucy, o Rogério e o Cláudio, o restante
seguia no máximo das forças, sendo eu o último do grupo.
Eu me concentrava em dominar a dor nas costa e nos
cálculos da média horária, no GPS eu via o caminho a ser feito e me desesperava em
saber, que o mesmo dava uma grande volta contornando um braço da represa, durante uns 5
quilômetros ficamos num rumo paralelo sem nos aproximar da balsa, só então
contornamos o braço da represa e tomamos
um rumo mais direto, ainda assim faltavam mais de quatro quilômetros. neste momento fiz
mais uns cálculos e percebi que tínhamos chances de chegar a tempo, mesmo sem precisar
que a balsa nos esperasse, neste trecho consegui até passar pelo Robie e o Ronei num
esforço insano e foi com grande satisfação que cheguei no porto e via a balsa ainda
lá, consultei o relógio: eram 12:56.
Foi na travessia da balsa que passamos pelo ponto mais
próximo, à 1,29 km da confluência da coordenada S21º 00 00 com a
coordenada W46º 00
00. Desembarcamos na vila de Itaci e
fomos direto para um armazém, onde nos saciamos com mortadela num pão doce, queijo e um
genérico de Fanta uva. Tínhamos ainda mais uma balsa, distante a 10 quilômetros, por um
trecho fácil e com duas horas de folga seguimos tranqüilo, chegando lá com tempo de
sobra e para nossa sorte o balseiro antecipou a saída. Mais uma vez na saída da balsa
outra subida longa e penosa, para o corpo que já tinha esfriado, restavam ainda 40
quilômetros e já tínhamos percorrido 80, isto significava que o total do dia seria em
torno dos 120 km e não 110, como previsto.
O trecho entre a segunda balsa do dia e a cidade de Campo do Meio eram
de
13 quilômetros, passando por plantações de milho e café, com
retões intermináveis, finalmente chegamos em Campo do Meio as 15:40 e fomos a procurado
nosso ônibus, paramos junto a uma lanchonete para um delicioso lanche
quente, chega de barrinha e bananinhas.
O trecho final do dia era um estradão para a cidade de Boa Esperança,
seriam 30 quilômetros com algumas subidas, mas na maioria apenas estrada plana. Eu havia
pedido um segundo lanche, pois as minhas energias estavam as minguas, e alguns estressados
já estavam querendo partir, como o caminho era de fácil orientação e eu fiquei
chateado com aquela pressa infundada, apontei o caminho e dei as poucas instruções
necessárias. Três do grupo partiram imediatamente, os demais ficaram, mas senti que
havia um desejo eminente de seguir em logo e isto fez aquele delicioso sanduíche descer
atravessado.
Partimos rumo a Boa Esperança, a tarde estava fresca, quase fria.
Saímos da cidade e entramos no estradão, pouco depois já tinha ser formado um pelotão,
do qual eu era o último, e que seguia num ritmo forte com a velocidade beirando os 30
km/h, então olhei para os lados e vi uma tarde linda e pensei "É espantoso como a
cidade grande contamina as pessoas com seu estresse, mesmo ali, na tranqüilidade do
interior sem nenhum compromisso de tempo pela frente, elas insistem em correr, em disputar
a todo instante posição em uma corrida sem nexo" ao terminar meu pensamento vi o
pelotão distante lá na frente e me senti feliz por conseguir ficar fora desta neurose,
segui tranqüilo curtindo um lugar e um momento inesquecível.
Alguns quilômetros a frente encontrei o grupo, aquele que tinha saído junto comigo de
Campo do Meio,
pois os três que saíram
primeiro já deviam estar chegando em Boa Esperança, parado me esperando, como não
estava a fim de impor o meu ritmo a eles, disse-lhe que poderiam seguir e não se
preocupar comigo, mas minha voz não escondeu o meu descontentamento pela falta de visão
deles em aproveitar aqueles momentos preciosos. Eles partiram na mesma pressa infundada,
mais a frente encontrei o Jorge parado e a partir dali ele seguiu comigo, eu por minha vez
não mudei de atitude, fui tranqüilo, tirando fotos do por do sol e das montanhas ainda
iluminadas.
A noite me alcançou quando ainda faltavam uns 15 quilômetros para Boa
Esperança, agora é curtir uma outra circunstância, onde a
concentração se dirige para o piso a frente
parcamente iluminado pelo farol, para vencermos o cansaço e as dores de uma longa jornada
sobre a bike, este exercício de atitude é imensamente prazeroso.
Vi luzes vermelhas piscando muito a frente e como elas não
desapareciam, conclui que os demais estavam parado, o que foi confirmado quando lá
cheguei. Eles estavam a um bom tempo parado ali, se recuperando das dores e comentando da
interminável e sofrida subida no topo da qual estavam, foi então que percebi a subida
que eu tinha vencido sem ao menos notar e me senti extremamente recompensado por saber
fazer a coisa certa, pena que não se pode transmitir este tipo de ensinamento facilmente.
Chegamos em Boa Esperança as 18:30, depois de 120 quilômetros e pouco
mais de dez horas de jornada.

Chegou o último dia d Crazy Trip 2003, nesta última etapa seriam
pouco menos de 50 quilômetros, pois ainda teríamos uma viagem de ônibus com mais de 300
km até São Paulo. Saímos de
Boa Esperança curtindo o visual da
represa, o primeiro trecho nos levaria a pequena cidade de Coqueiral por entre extensas
plantações e um restinho da Represa de Furnas, a segunda e última etapa do dia, seguia
por uma estrada com algumas subidas um tanto longas e passando por dois vilarejos, por fim
chegamos ao asfalto, por onde seguimos até a cidade de
Nepomuceno, onde terminamos o Crazy Trip 2003 Expedição das Confluências. Foram
quatro dias e 348 km de superação, lindos visuais e emoções inesquecíveis.